Comentários aos arts. 483 e 484 do CPC
Contribuição da Academia Brasileira de Direito Processula Civil
Da homologação de sentença estrangeira
1. Introdução
A homologação de sentença estrangeira é tema regulado em nosso diploma Processual Civil Brasileiro no Título IX, enunciado “do processo nos tribunais”.
A competência para a sua homologação era atribuída ao Supremo Tribunal Federal, conforme estava disposto na Constituição Federal. Contudo, com a promulgação da Emenda Constitucional nº 45/2004, a qual trouxe inúmeras inovações ao texto da Carta Magna, ocorreu a revogação do art. 102, I, “h”, transferindo ao Superior Tribunal de Justiça a competência para reconhecer a eficácia em nosso país de uma decisão proferida em outro Estado.
O tema a ser tratado se vincula, de certo modo, aos conceitos de territorialidade e soberania estatal. Miguel Reale1 ensina que o território constitui espaço social submetido à soberania jurídica e política de um certo Estado. Por essa razão, cada Estado costuma fazer e aplicar suas próprias regras dentro de seu território, ou seja, exercer sua jurisdição. No entanto, Barbosa Moreira expõe:
“a relevância dos atos jurídicos nem sempre se exaure nos limites territoriais do Estado onde são praticados”2
Há grande divergência quanto ao tratamento dado à temática, pelo que se denota dos diversos sistemas criados pelos Estados para tratar da homologação de sentença estrangeira. Os referidos sistemas serão mais adiante abordados.
No Brasil, à medida que ocorriam as reformas legislativas, também foram evoluindo as normas que tratam do reconhecimento das decisões estrangeiras, chegando-se ao sistema atualmente vigente, a delibação ou homologação de sentença estrangeira.
Hodiernamente, é de suma importância às relações internacionais, tanto as particulares quanto as públicas, o reconhecimento de decisões estrangeiras através da homologação, como forma de acompanhar o processo de integração econômica e política mundial e de cooperar com as demais nações. A pretensão do legislador brasileiro ao transferir a competência ao STJ, para homologar as decisões estrangeiras, foi simplificar este procedimento. Tal procedimento ganhou maior celeridade, também, com as modificações trazidas pela recente Lei 11.232 de 22/12/05, a qual modificou o processo de execução dos títulos executivos judiciais, extinguindo o processo de execução, que agora se dará no curso da ação, como uma fase executória.
2. Antecedentes Legais
A primeira referência à validez da sentença estrangeira se deu ainda no período do Brasil-Império, com a expedição do Decreto nº 6.982 de 27/06/19783, o qual estabeleceu o sistema de eficácia da sentença estrangeira. Aquele adotava o critério da reciprocidade, reconhecendo os efeitos da decisão alienígena de um país, contanto que este procedesse da mesma forma em caso inverso.
O Decreto nº 7.777 de 27/07/1880 aditou o anterior Decreto nº 6.982 para criar o exequatur do Poder Executivo.
Com a formação da República houve a substituição gradativa do sistema de reciprocidade pelo sistema de homologação proferida pela Suprema Corte, primeiramente surtindo efeito para as sentenças estrangeiras declaratórias da falência de negociantes que residissem no país prolator da sentença, nos termos do Decreto nº 917 de 24/10/1890, e posteriormente, com o advento da Lei nº 221 de 20/11/1894, que originalmente fixou competência do Superior Tribunal de Justiça para homologar sentenças estrangeiras.
As Constituições Federais de 1934, 1937, 1946 e a de 19884 retificaram a competência do STF.
O Código de Processo Civil de 1939 cuidou do tema nos artigos 785 e seguintes: já o atual Diploma Processual Civil5versou em seus artigos 483 e 484 sobre o processo de homologação e o processo de execução de sentença estrangeira.
Na Lei de Introdução ao Código Civil6, também são encontradas previsões acerca da temática. Em seu art. 15, por exemplo, estão deduzidos os requisitos para o reconhecimento da eficácia da sentença alienígena, assim como seu parágrafo único traz uma inovação controvertida, quando diz que as sentenças meramente declaratórias do estado das pessoas não estão sujeitas ao processo homologatório.
Atendendo à norma constitucional, a Suprema Corte comportou o assunto em seu Regimento Interno, datado de 18/06/1970, disciplinando o procedimento e requisitos para a homologação da sentença estrangeira nos dispositivos 215 a 224.
Sobreveio, por derradeiro, a Emenda Constitucional nº 45, de 31 de dezembro de 2004, a qual revogou o artigo 102, I, “h” da Constituição Federal e acrescentou a alínea “i” ao artigo 105, I, transferindo, desse modo, para o Superior Tribunal de Justiça, a competência para homologar sentença estrangeira e conceder o exequatur às cartas rogatórias passivas, que anteriormente era atribuída ao Supremo Tribunal Federal.
Neste cenário o STJ apressou-se em editar a Resolução n° 22, tomando para si a sua nova responsabilidade, porém obedecendo, provisoriamente, os ritos de homologação e execução do julgado estrangeiro previsto no regimento Interno do STF. No mesmo afã, o então Presidente do STJ emitiu o Ato n° 15 de 2005, conferindo a competência para a execução da sentença estrangeira ao Vice-Presidente do Tribunal.
Ambas normas foram explicitamente revogadas pelo artigo 15, da Resolução nº 9 de 04/05/05, sendo este o regulamento que vigora, atualmente, em conjuntura com as normas pertinentes da LICC bem como os artigos 483 e 484 do Código de Processo Civil em vigor.
3. Os Critérios ou Sistemas Legislativos Internacionais
Partindo-se da problemática da aceitação da eficácia de sentença estrangeira, alguns doutrinadores trataram de classificar os sistemas legislativos, que foram surgindo para estabelecer os critérios com que cada Estado trataria do tema.
Barbosa Moreira7 distinguiu em apenas dois tipos fundamentais os sistemas legislativos em face do reconhecimento da eficácia da sentença alienígena. O primeiro deles é o que recusa a eficácia, necessitando, assim, da instauração de novo processo perante órgão local, podendo este ter fundamento na sentença estrangeira ou não. O outro tipo reconhece a eficácia da sentença estrangeira, todavia condicionado a um ato de órgão nacional, que pode ser a simples verificação de requisitos (delibação ou homologação) até uma aprofundada revisão do mérito da causa, ou ainda, o sistema da reciprocidade, o qual exige do país, onde a sentença estrangeira se originou, idêntico tratamento dado ao seu julgado. Dentro desta segunda sistemática o autor ainda distinguiu os ordenamentos, levando em consideração o alcance dos órgãos estatais no tratamento da matéria.
Já Serpa Lopes8, citando Henry Cock, considerou que existe uma divisão mais definida, classificando os sistemas em face do tema, da seguinte forma:
- Sistema de recusa à execução dos julgamentos estrangeiros: não é atribuída nenhuma eficácia aos julgamentos estrangeiros, resguardando por completo seu monopólio estatal. Não se reconhece o processo de homologação.
- Sistema de revisão absoluta: há o julgamento do mérito da sentença estrangeira e não somente a análise de pressuposto de validade. Neste sistema o Estado analisa se a decisão é “justa ou injusta”. Por invadir o mérito da causa, diz-se que em verdade há uma substituição da sentença estrangeira e não puramente o reconhecimento da eficácia desta. Dos países que o adotam, cita-se Noruega, Holanda Dinamarca e Suécia. Esse processo de revisão absoluta (exequatur) originou-se na França, a qual até hoje o utiliza.
- Sistema de controle ilimitado: aqui também ocorre a revisão do mérito da causa, no entanto não há “substituição” de sentenças. Após examinar o mérito admite-se ou rejeita-se a sentença estrangeira.
- Sistema de controle limitado: não há exame de mérito, apenas exame em determinadas questões. Investiga-se a observância de alguns requisitos concernentes à ordem pública e costumes locais e formalidades processuais. É neste sistema que classificamos o processo de delibação ou homologação, utilizado atualmente no Brasil.
Desse último sistema, o juízo de deliberação, passa-se a um tratamento mais aprofundado.
2.1.O Juízo de Delibação
Atribui-se ao direito italiano a criação do giudizio di delibazione9 que, como observa Amílcar de Castro citado por Barbosa Moreira10, vem do latim delibatio onis, que é sinônimo de “colher um pouco de alguma coisa, tocar de leve, provar no sentido de experimentar, examinar, verificar”.
Neste sistema, chamado de homologação, não se exige a reciprocidade, nem tampouco se requer o ajuizamento de uma nova ação. Penetra-se no mérito da sentença alienígena de modo muito superficial e somente para verificar se esta não ofende a ordem pública e os costumes. Apurado o anteriormente mencionado, o julgado estrangeiro passa pela apreciação de outros pontos, para que então seja reconhecida e homologada. Estes pressupostos são exigidos como forma de preservar a soberania estatal e o sentimento social médio nos aspectos jurídicos e valorativos.
Não há revisão do mérito do julgado estrangeiro, também não é uma nova decisão. Moacyr Amaral dos Santos, citado pro Humberto Teodoro Junior, ensina que:
“o Estado não indaga a justiça ou injustiça da sentença estrangeira: verifica-se apenas se preenche determinadas condições frente às quais a nacionaliza e lhe confere eficácia em seu território”.11
A decisão estrangeira, frente à sistemática de homologação adotada no Brasil, tem natureza jurídica de sentença, enquanto ato jurisdicional propriamente dito.
3. Requisitos
É exigência do Superior Tribunal de Justiça que a sentença estrangeira não ofenda os requisitos materiais e processuais estabelecidos nos arts. 15 a 17 da LICC e, também, na Resolução nº 9 do STJ, nos arts. 5º e 6º, para que só então se reconheça sua eficácia e venha produzir efeito jurídico no Brasil.
1° requisito: haver sido a sentença estrangeira proferida por juiz competente (art. 15, “a”, LICC e art. 5°, I da Res. n° 9 do STJ): na utilização da melhor interpretação, o “juízo” deve ser competente, isto é, o Estado onde foi prolatada a sentença. Nesse ensejo também deve ser observado se a causa do julgado não constituía competência exclusiva da justiça brasileira, nos termos do artigo 89 do CPC e do § 1°, art. 12 da LICC.
2° requisito: terem sido as partes citadas ou haver-se legalmente verificado a revelia (art. 15 “b” LICC e art 5º, II da Res. Nº 9 STJ): esta condição diz respeito ao princípio do contraditório, que, como leciona o mestre Ovídio Batista da Silva12, é princípio basilar para a determinação do próprio conceito de função jurisdicional, constituindo garantia fundamental prevista na Constituição Federal, em seu artigo 5º, inc. LV. A não observação deste princípio acarreta a nulidade do processo: tratando-se de homologação da decisão estrangeira, se as partes não foram citadas, obedecendo aos atos procedimentais do país em que foram proferidas, isto acarretará o indeferimento de sua homologação no Brasil. A revelia também é admitida, contanto que a parte tenha sido devidamente chamada ao processo.
3° requisito: Ter a decisão estrangeira transitado em julgado e estar devidamente revestida das formalidades necessárias para que se produza efeitos no país onde foi proferida (art. 15 “c” LICC e art 5º, III da Res. Nº 9 STJ): não se requer que a decisão a qual se pleiteia homologação seja irrecorrível13, apenas que tenha transitado em julgado. Deve esta estar plenamente aparamentada dos requisitos formais, para que seja executada em seu país de origem. Esta matéria havia sido sumulada pela Suprema Corte na Súmula 420.
4° requisito: Estar autenticada pelo cônsul brasileiro e acompanhada de tradução por tradutor oficial ou juramentado no Brasil (art. 15 “d” LICC e art 5º, IV da Res. Nº 9 STJ): o tradutor deve ser juramentado no Brasil ou indicado por um magistrado brasileiro, devendo empregar de toda técnica na tradução, a fim de não modificar o sentido do texto. O STJ ainda menciona a necessidade do cônsul brasileiro, atuante no país da origem do julgado, autenticá-lo, para que se reconheça sua legitimidade jurídica no país em que foi prolatado.
5° requisito: Não ofender a soberania nacional, a ordem pública nem e aos bons costumes (art. 17 LICC e art 6º Res. Nº 9 STJ): deve-se atentar se o conteúdo dessa sentença estrangeira não é ofensivo frente ao sentimento social médio, se não choca a sociedade afrontando seus valores éticos e morais. Por soberania nacional entende-se como sendo o reconhecimento da independência econômica, territorial e política de um Estado.
4. Pontos controvertidos e inovações sobre a matéria
Conforme já foi referido ao longo desta explanação, a Emenda Constitucional n° 45, a qual constituiu uma verdadeira reforma do poder judiciário, modificou a competência para homologação da sentença estrangeira e para o cumprimento de cartas rogatórias de outros países, as quais passaram a ser atribuição do Superior Tribunal de Justiça14. A Resolução n° 9 do STJ passou a tratar de tais matérias em caráter provisório, até que seja instituída em Regimento Interno próprio, todavia tal resolução já prevê inovações e resolve algumas questões, que restavam controvertidos no ordenamento anterior.
Prepondera entre os doutrinadores a concepção do processo de homologação como sendo de jurisdição contenciosa, entre eles está Humberto Theodoro Junior15 que dispõe:
“Trava-se, inclusive, um contraditório entre o que pede a atribuição de eficácia à sentença estrangeira e a parte contraria que poderá negá-la, revelando, assim, a lide ou o conflito de interesses por pretensão resistida”.
Dividem da mesma opinião os autores Vicente Greco Filho e Barbosa Moreira.
Atribui-se carga constitutiva à decisão que reconhece a eficácia da sentença alienígena, pois se cria uma situação nova, que consiste exatamente no reconhecimento da eficácia sentencial, bem como na ampliação territorial de seus efeitos jurídicos.
A melhor jurisprudência entende por revogado o parágrafo único do art. 15 da LICC, o qual desobriga as sentenças meramente declaratórias do estado das pessoas a passar pelo processo homologatório. Já que, confrontando-se tal dispositivo com o art. 483 do CPC, vem à tona a divergência, pois a norma processual contida no artigo abrange a todos os tipos de sentenças sem distinção, afirmando a necessidade de serem homologadas.
Em se tratando de sentenças arbitrais proferidas no estrangeiro, a lei 9.307/01996 dedicou os arts. 34 a 40 para tratar de sua homologação no Brasil. Esta lei, que regula a Arbitragem, exauriu a necessidade da sentença arbitral estrangeira ser homologada no país em que foi proferida.
No ensejo do supra-referido, cabe expor que o art. 35 chegou a ser considerado inconstitucional por designar ao STF uma competência que não estava prevista no art. 102 da CF, no entanto com a transferência da competência para o STJ, o legislador deu fim a esta discussão. Necessário se faz a observação dos tratados internacionais no que couber ao assunto16: nesse sentido, Alexandre Câmara17 alerta que deverá se homologar no Brasil a sentença judicial estrangeira que, por sua vez, conferiu eficácia à decisão arbitral.
A Resolução n° 9 do STJ, além disso, esclarece alguns pontos tidos como controvertidos em seu artigo 4°. O § 1° prevê a possibilidade de homologação de provimentos que tenham natureza de sentença segundo as leis brasileiras, mesmo não sendo decisões judiciais. Já o § 2° afirma que as decisões podem ser homologadas parcialmente, só na parte que interessar ao requerente que suscita o processo homologatório. O § 3°, por sua vez, acolhe a possibilidade do STJ conceder medidas cautelares e antecipação de tutela nos processos de homologação de julgados estrangeiros, adotando, assim, posição diferente a do STF que entendia impróprias as tutelas de urgência. A jurisprudência já confirmou este entendimento no julgado STJ – MC 8.485 e MC 4.278. rel. Min. Nancy Andrighi e MC 5.503. Rel. Min. Aldir Passarinho Junior.18
Outras inovações no processo de homologação foram trazidas pelo art. 7° da Resolução, através do qual se possibilitou a permissão da concessão de pedido com conteúdo executório feito por carta rogatória proveniente de países estrangeiros. O STF negava o exequatur em medidas de caráter executório por não serem provenientes de sentença que transitada em julgado, contudo acatava estes pedidos, quando havia acordo internacional assinado entre o Brasil e o país em questão.19Também o mesmo artigo inova em seu parágrafo único prevendo o auxílio direto, devolvendo para que sejam cumpridos pelo Ministério da Justiça os pedidos provenientes de outros países quando verificado que estes não demandam o juízo de delibação (como no caso de solicitações de certidões, cópias e movimentações processuais, que não precisam ser objeto de análise quanto á sua admissibilidade se estiverem em conformidade com o ordenamento jurídico nacional, por serem públicas tais informações).20
Constitui impedimento à homologação o fato de já existir na justiça brasileira coisa julgada sobre o mesmo litígio, mesmo que o processo se encontre ainda tramitando em território pátrio, em conformidade com o preceito do artigo 90 do Código de Processo Civil. Nelson Nery Junior ensina, nesse diapasão, que:
“remanesce para o Estado brasileiro o poder de julgar causa já ajuizada ou já julgada em outro país enquanto a autoridade brasileira for competente e enquanto não houver homologação do julgado estrangeiro.” :21
Portanto a coisa julgada e a litispendência são fatos impeditivos de homologação da decisão estrangeira.
5. Comentários aos artigos 483 e 484 do CPC:
Art 483. A sentença proferida pro tribunal estrangeiro não terá eficácia no Brasil senão depois de homologada pelo Supremo Tribunal Federal.
Parágrafo Único. A homologação obedecerá ao que dispuser o Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal.
Este dispositivo processual trata do processo de homologação da decisão estrangeira bem como de sua competência.
Todo procedimento de homologação de sentença alienígena obedece ao disposto na Resolução n° 9 do Superior Tribunal de Justiça, que em seu artigo 1° criou as Classes Processuais de Homologação de Sentença Estrangeira e de Cartas Rogatórias no rol dos efeitos submetidos ao STJ. O parágrafo único interrompe, até nova determinação em regimento próprio, o pagamento das custas processuais dos processos que foram ajuizados após a publicação da EC n° 9, isto porque a mesma dispensa era dada pela norma anteriormente vigente (Regimento Interno do STF).
A legitimidade para homologar sentenças estrangeiras e conceder exequatur às cartas rogatórias é imputada pelo art. 2° ao Presidente do Superior Tribunal de Justiça, que atua como órgão monocrático, exceto para julgar impugnações e recursos, podendo o mesmo transmitir tal competência para o vice através de ato, como preceitua o parágrafo único.
A legitimidade para suscitar a homologação, segundo concepções doutrinárias e jurisprudenciais, é de qualquer pessoa que tenha interesse no reconhecimento da decisão no Brasil, seja o autor ou o réu do processo estrangeiro, seus sucessores ou terceiros que possam ser atingidos pela eficácia da sentença estrangeira.
A petição inicial, segundo o art. 2° da Res. n° 9 STJ, deve estar de acordo com as exigências de nosso ordenamento processual, obedecendo o art. 282 do CPC, e a ela deverá ser anexada certidão ou cópia do texto integral da sentença estrangeira e outros documentos necessários, tudo devidamente traduzido e autenticado. Fica vetado, portanto, a discussão de mérito.
O presidente se encarregará de verificar se estão presentes os requisitos do art. 5° e seus incisos e se são considerados os pressupostos da soberania e da ordem pública, observados no art. 6°.
O art. 8° prevê que o prazo contestacional é de 15 dias. O conteúdo do recurso enuncia o art. 9°, somente versará sobre a autenticidade dos documentos, a inteligência da sentença e a observância dos requisitos indicados nesta Resolução. O § 2° deste último artigo indica, frente à revelia ou incapacidade da parte requerida, a nomeação de curador especial, que deverá ser notificado pessoalmente.
Ao Ministério Público será dada vista dos autos processuais pelo prazo de 10 (dez) dias, conforme artigo 10, que ainda terá o poder de impugnar a decisão.
Se não houver contestação do pedido de homologação, o Presidente do STJ passará a decidir e da decisão caberá o agravo regimental no prazo de 5 (cinco) dias.
Se for contestada a demanda, o processo será distribuído para ser julgado pela corte especial, que designará relator para proceder aos demais atos processuais ordinários e instrutórios, na forma do § 1° do art. 9°.
Da decisão proferida pela corte especial ou pelo vice-presidente do STJ, caberá embargos declaratórios, que terá o fito de esclarecer eventual contradição ou obscuridade e suprir lacunas na decisão, obedecendo ao preceituado nos arts. 262 e 265 do Regimento Interno do STJ.
Em conseqüência do deslocamento para o STJ da competência para homologar as decisões alienígenas, abre-se a possibilidade do STF vir a reapreciar a decisão através da interposição do Recurso Extraordinário, porém somente nos casos em que houver a contrariedade de dispositivo constitucional ou ainda declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal, com base no art 102, III da Constituição Federal.
Art. 484 CPC. - A execução far-se-á por carta de sentença extraída dos autos da homologação e obedecerá às regras estabelecidas para a execução da sentença nacional da mesma natureza.
O presente artigo do CPC cuida do procedimento executório da sentença estrangeira homologada, que obedecerá às mesmas regras estabelecidas para executar sentença nacional. Redação muito semelhante tem o art. 12 da resolução n° 9 do STJ.
Antigamente, com a homologação da sentença estrangeira, esta se revestiria em título executivo judicial, conforme o art. 584, IV, do CPC, sendo competente para o processo de execução o juízo federal de primeira instância (art. 109, X, CF). Porém, devido o processo de execução ser considerado hoje um dos maiores entraves à agilidade do Poder Judiciário, ele foi abolido pela Lei 11.232, de 22 de dezembro de 2005, que dentre outras significativas modificações prevê o “cumprimento da sentença” como uma fase procedimental posterior ao trânsito em julgado, sem a necessidade de instauração de um processo de execução.
À luz do novo artigo 475-N, VI de nosso Código Civil temos que a sentença estrangeira homologada pelo Superior Tribunal de Justiça constitui em nosso ordenamento título executivo judicial.
Vigora desde o dia 24 de junho de 2006 a Lei n° 11.32 de 23/12/05, integrante do projeto mini reformas do CPC, que nas palavras do juiz Pedro Luiz Pozza22 substancialmente modifica o conceito de sentença, institui o cumprimento da sentença e altera o procedimento da execução provisória.
Pela inteligência do art. 269 CPC, o ato de resolver o mérito constitui sentença. Desta feita o processo não se extingue com a publicação da sentença, prosseguindo até que esta seja cumprida, o que acarretou a modificação do enunciado do art. 463 do CPC.
Neste bojo, o legislador agregou ao Livro I, Titulo VIII, o novo Capítulo X, intitulado “Do cumprimento da sentença”, que contém os arts. 475-I ao 475-R. Os mencionados artigos excluem por completo o processo de execução de sentença e incluem no processo de conhecimento uma última fase executória da sentença, a qual deverá ser cumprida ou efetivada, sem a necessidade de instauração de processo específico de execução.
Contudo o parágrafo único do art. 475-N faz uma ressalva à nova lógica instituída para o cumprimento da sentença, preconizando que nos casos dos incisos II, IV e VI, este último referente à sentença estrangeira homologada pelo STJ, o mandado inicial de penhora e avaliação (art. 475-J) incluirá a ordem de citação do devedor, no juízo cível, para liquidação ou execução, conforme o caso. Desta forma, em havendo citação do devedor, instaurar-se-á uma relação processual até então não existente.23
1 REALE, Miguel, Lições Preliminares de Direito, 1996: p. 338.
2 MOREIRA, José Carlos Barbosa, Comentários ao Código de Processo Civil, 1994: p 44.
3 em atenção ao art. 6º, § 2º, da Lei nº 2.615 de 04/08/1875.
4 Art. 102, I, “h”.
5 Lei 5.869 de 11/01/1973.
6 Decreto-Lei nº 4.657 de 04/09/1942.
7 MOREIRA, José Carlos Barbosa, Comentários ao Código de Processo Civil, 1994: p. 47.
8 GRECO, Vicente Filho. Direito Processual Civil Brasileiro, 1996: p. 386.
9 MOREIRA, José Carlos Barbosa, Comentários ao Código de Processo Civil, 1994: p. 49.
10 Moreira, José Carlos Barbosa, Comentários ao Código de Processo Civil, 1994: p. 49.
11 Theodoro Júnior, Humberto, Curso de Direito Processual Civil, 2004: p. 603.
12 Silva, Ovídio Araújo Baptista da, Curso de Processo Civil, 1991: p 55.
Leite, Gisele. Comentários à homologação de sentença estrangeira. Disponível na internet: http://www.mundojurídico.adv.br. Acesso em 29 de junho de 2006.
14 art. 105, I, “i”, CF.
15 Theodoro Júnior, Humberto, Curso de Direito Processual Civil, 2004: p. 603.
16 Convenção de Nova Iorque de 10/06/1958: Convenção Interamericana sobre Arbitragem Comercial Internacional do Panamá de 30/01/1975: Convenção Interamericana sobre a Eficácia Extraterritorial das Sentenças e laudos Arbitrais Etrangeiros de Montividéu de 08/05/1979, Protocolo de Lãs Leñas de 27/06/1992
17 CÂMARA, Alexandre de Freitas. Lições de Direito Processual Civil, 2006.
18 Gama Jr., Lauro. O STJ e a homologação de sentenças arbitrais estrangeiras: novas perspectivas?. Disponível na internet:http://www.mundojuridico.adv.br . Acesso em 04 de julho de 2006.
19 Gama Jr., Lauro. O STJ e a homologação de sentenças arbitrais estrangeiras: novas perspectivas?. Disponível na internet:http://www.mundojuridico.adv.br . Acesso em 04 de julho de 2006.
20 Araújo, Nádia de. As novidades da resolião n° 9 do STH, que dipõe sobre cartas rogatórias e sentenças estrangeiras. Disponível na internet:http://www.dip.com.br . Acesso em 04 de julho de 2006.
21 Nery Junior, Nelson &: NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de processo civil comentado e legislação processual civil extravagante em vigor, 2002: p. 418.
22 POZZA, Pedro Luiz. As importantes reformas processuais trazidas pela Lei n° 11.232/05. Disponível na internet:http://www.espacovital.com.br . Acesso em 03 de julho de 2006.
23 POZZA, Pedro Luiz. As importantes reformas processuais trazidas pela Lei n° 11.232/05. Disponível na internet:http://www.espacovital.com.br . Acesso em 03 de julho de 2006.
SCHNEIDER, Karen Schneider; DIAS, Luciane Dias; BILHALVA, Mateus Bilhalva; BENAVENTANA, Marcelo Benaventana. Comentários aos arts. 483 e 484 do CPC. Revista Páginas de Direito, Porto Alegre, ano 7, nº 678, 24 de Novembro de 2007. Disponível em: https://www.paginasdedireito.com.br/artigos/todos-os-artigos/comentarios-aos-arts-483-e-484-do-cpc.html